quarta-feira, 27 de março de 2013

A FERA DE BARRA


Quando cheguei a casa de minha mãe, 
encontrei-a na cadeira de balanço.
Perguntou-me: -"O que há de novo"?

Contei-lhe o rapto e a morte
do menino João Felipe. 
Disse-lhe da consternação 
que tomara conta da cidade.

Indignada, e com a voz firme, 
quase como político em comício, 
angustiada afirmou:

- “ Viver é renunciar.
Renunciamos a tudo.
A renúncia é o que marca nossas vidas”.

A lucidez de minha mãe, 
aos 91 anos, me espantou. 
Mantive-me atento, percebi que iria continuar.

- “É desde o nascimento.
Renúncias na adolescência,
no casamento e, sobretudo, 
renúncias pelos filhos.
E, de repente, vem uma louca e faz com que
todo nosso sacrifício tenha sido vão.”

Levantei-me, beijei-lhe a testa e disse-lhe:

Parabéns!
Brilhante e, sobretudo, inovadora
 reflexão sobre o crime.

Arregalou os olhos, 
espantadíssima e perguntou-me :

- “Crime...que crime? Me conta...”.



5 comentários:

  1. Respostas
    1. A loucura fala: Digam de mim o que quiserem(pois ñ ignoro como a loucura é difamada todos os dias,mesmo pelos q são os mais loucos),sou eu,no entanto,sómente eu,por minhas influências divinas,que espalho a alegria sobre todos os deuses e homens.

      Excluir
  2. Sei como é, não passar por essa barbárie, mas sentir os rápidos momentos de uma inexplicável lucidez.

    ResponderExcluir
  3. Por mais frágil que esteja o cérebro aflora o forte amor materno e a dignidade vivida.

    ResponderExcluir
  4. O rapto e o assassinato da criança deixaram Barra do Piraí em transe. Passaram-se seis meses e já é apenas um caso. A memória do povo é um problema quase tão grande quanto a de minha mãe.

    ResponderExcluir